segunda-feira, março 13, 2006

CARTA ABERTA AO SR. PRESIDENTE DA REPÚBLICA PORTUGUESA

CARTA ENVIADA POR EDUARDO NEVES MOREIRA AO PRESIDENTE CAVACO SILVA



Rio de Janeiro, 12 de Março de 2006


"Exmo. Sr.

Presidente da República Portuguesa

Prof. Dr. Aníbal Cavaco Silva

Palácio de Belém

Lisboa – Portugal



Excelência:



Felicitando-o pela recente investidura no cargo mais importante do nosso país, desejo-lhe
as maiores venturas no desempenho do mesmo e aproveito a oportunidade para expor-lhe alguns
detalhes sobre uma Lei que se encontra na Presidência da República para merecer o exame de V.
Exa. e, que face à importância que a mesma possui para as nossas comunidades emigrantes,
deve merecer o tratamento mais adequado e necessário para a consecução dos objectivos em
função dos quais a mesma foi elaborada.

No ano de 1998, quando eu presidia o Conselho das Comunidades Portuguesas,
apresentei uma proposta de Recomendação em reunião do citado órgão no qual propunha a
alteração de Lei da Nacionalidade no sentido de que fosse concedido o direito à nacionalidade de
origem aos netos de portugueses nascidos no estrangeiro, a exemplo do direito que já possuem
os filhos de portugueses em idêntica situação. Tal proposta recebeu a aprovação unânime dos
membros do Conselho Permanente das Comunidades Portugueses, tendo sido encaminhada ao
Governo para exame, mas nada foi feito que permitisse dar corpo ao pleito. Posteriormente,
quando exercia o cargo de Deputado da Assembleia da República, para o qual fui eleito pelo
Círculo da Emigração de Fora da Europa, apresentei um Projecto de Lei, no qual se previa a
concessão desse direito aos netos de portugueses. Infelizmente, antes que o projecto fosse
votado, com a dissolução da Assembleia da República, o mesmo foi arquivado como todos os
demais projectos em andamento.

Iniciada a nova legislatura, a PSD, dando continuidade à minha iniciativa e atendendo aos
pedidos emanados de todas as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, apresentou
novo Projecto de Lei prevendo a concessão do pleito em favor dos netos. Como o governo havia
formulado proposta de alteração da Lei da Nacionalidade para conceder o direito à nacionalidade
portuguesa aos descendentes dos imigrantes estrangeiro nascidos em Portugal, ambas as
iniciativas transitaram em conjunto, tendo sido aprovadas na generalidade pelo plenário da
Assembleia da República. No entanto, na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos,
Liberdades e Garantias, o texto de ambas as iniciativas (o do governo e do PSD) foi unificado,
transformando-se num único projecto, que foi submetido à aprovação na especialidade pelo
plenário da Assembleia da República. Entretanto, embora que o projecto do PSD previsse a
concessão da nacionalidade de origem aos netos de portugueses, a redacção submetida à
votação dos senhores Deputados, admitiu apenas o direito à naturalização, que além de ser um
direito mais restrito, criou um problema de diferenciação indesejável, que acredito ter passado
despercebido pelos senhores parlamentares que não atentaram para a discriminação que
estavam a aprovar.

A maioria dos países onde se encontram acolhidas as nossas comunidades no estrangeiro
prevê que, quando um seu natural se naturalizar com uma nacionalidade estrangeira, perde
automaticamente a sua nacionalidade de nascimento, surgindo daí, a hipótese de vir a ficar
estrangeiro no próprio país onde nasceu e sempre viveu. O mesmo não ocorre quando o mesmo
obtém a nacionalidade pelo vínculo sanguíneo, ou seja, a nacionalidade de origem prevista no
projecto apresentado pelo PSD e que foi inadvertidamente alterado.

Se prevalecer o texto aprovado pela Assembleia da República e que aguarda a aprovação
presidencial, vamos assistir a uma situação inaceitável pois surgirão três classes de netos de
portugueses:

- aqueles que têm a nacionalidade de origem, obtida pela transmissão de seus pais, filhos de
portugueses, que previamente tenham obtido a nacionalidade;

- aqueles que não podem obter a nacionalidade portuguesa, porque os seus pais (filhos de
portugueses) não obtiveram a nacionalidade tendo falecido antes de a pleitearem e não desejam
pleitear a naturalização sob pena de perderam a sua nacionalidade de nascimento;

- os que obtiverem a nacionalidade por naturalização, que além de ser uma concessão com
restrições legalmente estabelecidas, é um direito pessoal e intransferível, criando uma
discriminação altamente indesejável.

Diante do exposto apelo para o bom senso de V. Exa. e no seu indiscutível sentido de
Estado que sempre nos transmitiu, para, de conformidade com os poderes que lhe são
constitucionalmente conferidos, fazer retornar o texto legal em apreço à Assembléia da
República para ser corrigido, visto que alguns dos senhores Deputados já informaram do seu
equívoco, pois desconheciam que a legislação vigente nos principais países de acolhimento das
nossas comunidades punia com a perda da nacionalidade aqueles netos de portugueses que
viessem a se naturalizar portugueses. Com a reinclusão da proposta inicial do PSD que prevê a
concessão da nacionalidade de origem, a exemplo da que é prevista para os filhos de
portugueses, o assunto estará plenamente solucionado, fazendo-se justiça e evitando-se uma
situação tão discriminatória e reconhecidamente ineficaz para a manutenção da nossa presença
no estrangeiro.

Com os melhores cumprimentos e a estima pessoal de



Eduardo Artur Neves Moreira

Ex-Deputado na Assembléia da República pelo Círculo de Fora da Europa

Ex-Presidente do Conselho Permanente das Comunidades Portuguesas"